domingo, 15 de março de 2009

Hotel Mumu (parte 4) - O juramento final

É óbvio que nenhum vestibular de medicina é compatível com uma noite mal dormida. E ao entrar no campus da faculdade eu já tinha comigo que seria dificílimo vencer todos aqueles concorrentes que se aglomeravam nos corredores.
O Drovetto parou, olhou o movimento e disparou:

- Meu pai, se eu passar nessa porra de vestibular eu prometo fazer um sacrifício!
- O quê?
- É isso mesmo... eu prometo fazer um sacrifício?
- Você tá tão desesperado assim que já tá apelando pra promessas?
- Ah cara, faço qualquer coisa pra entrar. Meu pai já me avisou que não vai pagar cursinho mais pra mim não.
- Então trata de prometer algo bem difícil porque do jeito que estamos... sem dormir e sem comer direito... não sei não. Você ainda tem mais chances do que eu porque o seu curso é bem menos concorrido, mas mesmo assim...
- Meu, então se eu passar prometo voltar a Mogi antes das aulas começarem e passar mais uma noite no Mumu, e dessa vez sozinho!
- Cara, não promete o que não pode cumprir!
- Mas eu cumpro. Se eu passar eu cumpro.

Chovia uma fina garoa. Eu we Drovetto arrumávamos nossas coisas felizes da vida por termos sobrevivido. No total, se bem me lembro, foram três dias sem utilizar o banheiro, os quais, graças a Deus, foram interrompidos nos últimos minutos de nossa estadia naquela espelunca. Encontrei um rapaz que fazia cursinho comigo e tratei de puxar assunto com o único objetivo de pedir o banheiro do quarto reformado dele (um dos melhores que havia no Mumu) por alguns minutos.

O alívio foi grande e eu pude respirar melhor dali para frente.

Mas, voltando à contabilidade. Foram quase três dias sem ir ao banheiro e dois sem sequer tomar banho, pois as condições não nos permitia arriscar. Com o dinheiro que gastamos, incluindo refeições no Mc Donald´s e no restaurante 'bonzinho' do portuga, junto com a estadia e a compra de circulador de ar, lençol, extensão elétrica e corridas de táxi, conseguiríamos ficar num hotel muito melhor que aquele.

O Drovetto não quis almoçar e estralou o sorriso no rosto ao ver seu pai chegando. Um tchau bem mal dado foi o suficiente para ele logo embarcar no carro e sumir na esquina.

Fiquei aguardando meus tios que, pelo fato de terem amigos em Mogi, estariam aproveitando a carona que me dariam de volta para visitá-los.

Meses mais tarde me encontrei com o Drovetto no shopping Paineiras. Havíamos marcado um encontro. Ele foi com a namorada. Na saída, me ofereceu uma carona no seu novo carro, presente do papai por ele ter, de fato, passado no vestibular da UMC. No para-brisa trazeiro do corsinha vinho dele, um colante: Fisioterapia UMC.

- E a promessa? Vai cumprir?
- Vou sim, mas resolvi esperar um pouco... pra me acertar direitinho na cidade.
- Olha lá hein... promessa é dívida! Brinquei.

Dois anos se passaram e um dia eu o encontro no Maxi Shopping. Dessa vez eu estava com minha namorada e ele só. Eu havia ingressado em jornalismo na Unesp e estava de férias em Jundiaí.

- Já se formou?
- Estou no último ano. E está muito difícil... meu, tô com medo de não passar.
- Já pagou a promessa?
- Que promessa?
- A de você voltar ao Mumu.
- Nossa... nem me lembrava mais disso... putz, nem fui mais lá.
- Cuidado, que você pode estar tendo dificuldades para se formar por causa disso.
- Ah meu, eu que não vou voltar naquela *&%# de hotel.
- Se não for, o Mumu vai ficar te chamando nos seus pesadelos.

Nos despedimos e desde então nunca mais o vi.
Fiquei sabendo apenas que ele enlouqueceu e hoje faz tratamento psiquiátrico em Mogi das Cruzes. Pasmem: seu psiquiatra é parecido com o Mussum e todos o chamam de Mumu...

Coisas além da imaginação!

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O último parágrafo é ficção... o Drovetto deve estar bem hoje em dia. Pelo menos acho que deve! Rsrsrs.

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